É fisicamente impossível qualquer pessoa prestar atenção em tudo que os anunciantes esperam. Dezenas de milhares de produtos e serviços são introduzidos no mercado todos os anos e com eles, adivinha…mais propaganda. Sabe aquela sensação de que os dias e os anos estão sempre passando mais rápido? Aposto que essa é uma conversa presente nas confraternizações em família.
– “Nossa, como esse ano voou”.
– “Sim, parece que foi ontem que a Mariazinha nasceu e já está com 8 anos…”
Essa sensação acontece porque as lacunas de tempo que costumávamos ter (estou falando de 10, 15 anos atrás…) já não existem mais. Somos bombardeados todos os dias com tanta informação que a sensação é que o dia acaba em 5 minutos. Há televisões nas academias, telas no aeroporto, newsletters diárias sobre qualquer tipo de assunto (olha eu aqui!) propaganda em mictórios e mais de um celular por habitante em nosso país. Vivemos uma verdadeira crise de atenção.Todo mundo olha pra tudo e ao mesmo tempo, ninguém vê nada. Foco é quase uma utopia. E num mundo onde atenção vale mais do que dinheiro, o que conhecemos como marketing tradicional está sofrendo derrotas atrás de derrotas.
Mas como nós, marketeiros e anunciantes, podemos sobreviver a esse caminho, que eu aposto não ter volta mais? Marketeiros inteligentes descobriram que o jeito “antigo” de anunciar e vender produtos não está funcionando tão bem quanto antes e procuraram agressivamente um jeito novo de continuar vendendo e conquistando mercado. A esse “novo jeito”, Seth Godin batizou de Marketing de Permissão. Um modo completamente distinto de pensar a respeito da propaganda e do mercado consumidor.
Não existe mais espaço para tantos anúncios
Lembro exatamente quando tinha 7 ou 8 anos, eu chegava da escola e corria pra frente da televisão para cumprir minha rotina diária. Às 17h30 eu assistia As Aventuras de Tim Tim, na sequência era Gato Felix, às 18h30 começava os Jatsons, e depois eu emendava Johnny Bravo e a Vaca e o Frango.
Eu não podia escolher o que assistir. Eu era submetido a programação mainstream dos poucos canais que tínhamos. Se voltarmos um pouco mais no tempo, na época dos meus pais e avós, existiam apenas 4 ou 6 canais de televisão. Outra meia dúzia de rádios locais, algumas revistas e jornais e só. A propaganda se limitava a isso. Todo mundo assistia aos mesmos programas, aos mesmos comerciais. As pessoas compravam os mesmos produtos, todo mundo parecia pertencer à mesma comunidade.
O marketing tinha uma “fórmula consagrada de sucesso”. Se o seu produto fosse minimamente bom, bastava comprar alguns espaços publicitários e as pessoas comprariam seu produto.
Agora, vou fazer um desafio pra você: tente lembrar…
…quais programas de TV você assistiu nos últimos 10 dias?
…quais revistas ou livros você leu no último mês?
… quantos canais por assinatura você tem?
…quantos podcasts, playlists, canais do youtube, newsletters…você assina?
Quais foram os últimos 3 grandes filmes que você assistiu?
Com muita sorte, 10% de vocês vão lembrar de algumas das questões acima.
Marcas por Todo Lugar
Repare agora mesmo por quantas marcas você já foi impactado só hoje: camisetas com seus logos característicos, marca na garrafa de água que você está bebendo, a marca do seu celular, o logo do seu sistema operacional, os banners no portal de notícia que você entrou pra ver as novidades do seu time, o ar condicionado, o cartão do seu banco…
Pois é… estamos em meio a tanto ruído que muitas vezes não lembramos os caminhos para lugares diferentes da cidade. Nos acostumamos a colocar nossos destinos no GPS para liberar espaço nosso cérebro e tentar absorver ainda mais ruídos. Há 100 anos os marqueteiros dependem quase exclusivamente dessa fórmula de marketing, que chamamos de Marketing de Interrupção. Interrupção é interromper o que os espectadores estão fazendo para fazê-los pensar em outra coisa. Mas em pleno 2022 isso já não é mais suficiente.
A Crise de Marketing que o Dinheiro não vai Resolver
“A medida que o espaço para os anúncios fica abarrotado, torna-se mais difícil interromper o consumidor. Imagine que você está num aeroporto vazio, de manhã cedo. Você não vê quase ninguém enquanto caminha claramente para o avião.
De repente alguém se aproxima e diz: “Com licença, você pode me dizer como chegar ao portão sete?”. Claro que você não tinha nem a esperança nem a expectativa de que alguém viesse e fizesse essa pergunta, mas, como essa pessoa parece legal e você pode parar um instante, você interrompe seus pensamentos e mostra o caminho. Agora imagine o mesmo aeroporto, mas às 3 da tarde, e você está atrasado para seu voo. O terminal está repleto de gente, todos se atropelando. Você foi abordado cinco vezes por várias falsas instituições de caridade a caminho do portão, e ainda por cima, está com dor de cabeça.
A mesma pessoa se aproxima e faz a mesma pergunta. É provável que a sua resposta seja um pouco diferente. Se você for nova-iorquino (ou Curitibano), talvez simplesmente ignore. Ou talvez pare o que está fazendo, diga “desculpe” e siga adiante. Há um terceiro cenário, ainda pior. E se ela for a quarta, ou a décima, ou a centésima pessoa que já fez a mesma pergunta? Cedo ou tarde, você vai isolar as interrupções. Cedo ou tarde, vira tudo ruído de fundo. Bem, a sua vida se parece muito com essa cena no aeroporto. Você tem coisas demais a fazer, e não tem tempo o suficiente para fazê-las. Você está sendo parado por estranhos o tempo todo. Todo dia você é exposto a mais de 7 horas de mídia. A maior parte dela é otimizada para interromper o que você está fazendo. E está ficando cada vez mais difícil encontrar um pouco de calma.
O irônico é que os marqueteiros responderam a esse problema com a pior cura possível. Para enfrentar o abarrotamento e a eficácia cada vez menor do Marketing de Interrupção, eles estão nos interrompendo mais ainda! Isso mesmo. Ao longo dos últimos trinta anos, os anunciantes aumentaram drasticamente seus gastos com anúncios. Eles também aumentaram o nível de ruído dos anúncios – mais jump cuts, mais técnicas cruas – e procuram por toda parte novas maneiras de interromper seu dia.
Trinta anos atrás, as roupas não tinham logomarcas enormes. Os intervalos comerciais na televisão eram curtos (também não tinha os 5 segundos de propaganda no Youtube). As revistas raramente tinham trezentas páginas de anúncio (como é o caso de muitas revistas de informática hoje em dia). Você conseguia até mesmo assistir à TV pública sem ver várias referências ao “patrocinador”.
Os anunciantes responderam ao aumento do ruído aumentando ainda mais o ruído. E, como no caso da poluição, como ninguém é dono do problema, ninguém está dando duro para resolvê-lo.”
Seth Godin em Marketing de Permissão – 1999.
Para Resumir o Problema enfrentado pelo Marketing de Interrupção
1- A atenção das pessoas é escassa
É impossível alguém ver tudo, lembrar de tudo. A medida que o ruído na vida das pessoas aumenta, a percepção das mensagens recebidas diminui. É um fato.
2- O dinheiro das pessoas é finito
Não tem como comprar tudo. É preciso escolher. Mas como a atenção é limitada, o cliente só pode comprar o que consegue ver.
3- Quanto mais produtos na praça, mais concorrência, menos dinheiro para circular.
Toda vez que você compra um tênis Nike, você não compra um Adidas. Quanto mais novos produtos são lançados no mercado é igual a mais oportunidades para o cliente. Inevitavelmente teremos mais perdedores (anunciantes) do que ganhadores.
4- Em busca de mais atenção, o marketing precisa gastar mais dinheiro…é uma conta sem fim.
Gastar menos dinheiro que a concorrência em anúncios, em um ambiente cheio de ruídos, é inevitável que o resultado seja um volume menor em vendas.
5- Isso custa caro
O marketing de interrupção não tem outra escolha a não ser gastar cada vez mais dinheiro das empresas em busca de destaque na multidão.
6- Mas, como vimos acima, gastar mais dinheiro leva a mais ruído.
Mas existe uma saída…
“A propaganda que funciona é aguardada, pessoal, e pertinente”.
Marketing de Permissão é um Casamento Feliz
Vamos dizer que “Marketing Tradicional” é uma pessoa e “Marketing de Permissão” é outra.
O marketing tradicional está querendo se casar. Ele vai ao melhor alfaiate da cidade, compra o terno mais caro, sapatos de couro italiano, acessórios importados. Em seguida, seus especialistas de dados e seus estrategistas traçam informações em busca do BAR IDEAL. O Marketing Tradicional entra no bar, dá uma olhada em sua volta, mira uma pessoa e a pede em casamento. É claro que a resposta é não, então o MT vai até a próxima pessoa e tenta a mesma abordagem e repete esse processo com cada pessoa no bar.
Se o MT não tem resultado após passar a noite inteira pedindo às pessoas em casamento, é óbvio que a culpa é do terno e dos sapatos italianos. O alfaiate é demitido, quem comprou o sapato e quem traçou as estratégias em cima dos dados também são.
É assim que a maioria dos clientes tradicionais enxergam o mundo. Eles contratam agências, pesquisas e consultores para descobrirem o lugar e a mensagem ideal para seus anúncios. Interrompem as pessoas na esperança que 1 em 100 vá comprar alguma coisa. E, então, quando isso dá errado, eles demitem a agência.
Já o Marketing de Permissão tem uma forma de se casar muito mais divertida e interessante. Chama-se: desenvolver o relacionamento. Um MP vai até um bar, dá aquele “giro” pelo local, encontra o “público-alvo”, dá uma piscadinha e senta para conversar.
O MP, muito cordial, paga uma bebida e pede o telefone para a pessoa em questão. No dia seguinte eles marcam um café, depois um almoço, um pic-nic, uma viagem, outro encontro, outro encontro e assim por diante. Depois de uns 12 ou 15 encontros eles já conseguem se comunicar bem a respeito das suas necessidades e desejos. Depois de 20 encontros eles conhecem as famílias um do outro. Após uns 8 a 10 meses de namoro, o Marqueteiro de Permissão faz o pedido de casamento.
E não para por aí. Depois do casamento (quando a pessoa vira efetivamente o cliente) o relacionamento deve continuar. O encantamento através de jantares, flores, comprometimento e fidelidade é fundamental para fugir do ruído do Marketing de Interrupção.
O Marketing de Permissão, então, é como namorar e casar. Ele transforma os estranhos em amigos e os amigos em clientes da vida toda.
Mas, então. Como fazer esse tal Marketing de Permissão?
O primeiro encontro em um namoro é sempre o mais importante. O lado oposto precisa sentir que vai levar alguma vantagem daquilo tudo. Sem um motivo egoísta para continuar a namorar, seu novo cliente potencial (e seu novo namorado potencial) negará uma segunda oportunidade. Se você não oferecer um benefício suficientemente interessante para seu prospecto, sua oferta vai sofrer o mesmo destino de todas as outras propagandas que estão correndo atrás dele… ela será ignorada. Esse benefício – ou incentivo – pode vir através de uma rifa, informações preciosas, entretenimento, experiência…porém, deve ser claro, óbvio e entregue de maneira clara.
Usando a atenção oferecida pelo cliente, o marketing de permissão dá aulas ao longo do tempo, explicando ao consumidor como é o produto ou serviço que ele tem a oferecer. Nós sabemos que o primeiro encontro é uma oportunidade de obter um segundo encontro com a outra pessoa. Cada passo do caminho tem que ser interessante, útil e relevante. O terceiro passo envolve reforçar o incentivo. Com o tempo, qualquer incentivo se desgasta. Assim como seu namorado pode se cansar até mesmo do melhor restaurante, o cliente prospectivo pode demonstrar cansaço do mesmo incentivo repetido. O Marketing de Permissão precisa trabalhar para reforçar o incentivo e para ter certeza de que a atenção se mantém.
Junto com o reforço do incentivo, agora é preciso aumentar o nível de permissão que o marqueteiro recebe do cliente em potencial. Em termos de marketing, o objetivo é motivar o consumidor a dar cada vez mais permissão ao longo do tempo. Permissão para coletar mais dados a respeito da vida pessoal, dos hobbies ou interesse do cliente. Permissão para oferecer uma nova categoria de produto para a avaliação do cliente, para oferecer uma amostra do produto. O espectro de permissão que você consegue obter com um cliente é bem amplo, e limitado apenas por sua relevância para o cliente.
Ao longo do tempo, o marqueteiro usa a permissão que ele conseguiu, para alterar o comportamento do consumidor, ou seja, fazer com que ele diga “sim, aceito”. É assim que você transforma a permissão em lucros. Depois que a permissão é concedida, ela se torna um ativo realmente importante para o marketing. Agora você pode viver feliz para sempre repetindo o processo mencionado acima, enquanto vende cada vez mais produtos ao cliente. Lembre-se, você tem acesso àquilo que um cliente tem de mais valioso – sua atenção.
Não existe mais “cliente bobo”. Tempo é fundamental.
É! Está na hora de você começar a repensar suas estratégias.
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Forte abraço,
Guilherme Dias
Artigo adaptado com trechos do livro “Marketing de Permissão – Seth Godin”